Saberes outros: Estudos e ações indígenas

“Saberes outros: estudos e ações indígenas” é um projeto de natureza extensionista (integrado à pesquisa), que parte do princípio de que a formação de professores em geral (e mesmo de outros profissionais) não leva em consideração do fato de que o Brasil é um dos países mais multilíngues/multiculturais do mundo, no qual são faladas, hoje, por volta de 200 línguas (incluídas aí as variedades de língua), das quais cerca de 170 são indígenas e outras 30, línguas de imigrantes (Oliveira 2000).

Especificamente em relação aos povos indígenas, no estado do Paraná, segundo dados oficiais do governo (2006), estão presentes as etnias indígenas Kaingang e Guarani, como quase 15.000 indivíduos (IBGE, 2010).

Entendemos que não considerar sua presença na história do país, além de um desrespeito aos povos originários, é uma perda em termos de diferentes possibilidades de compreender o mundo, uma vez que o conhecimento a que nós, não indígenas, temos acesso advém de uma única fonte/perspectiva: a eurocêntrica.

Por essa razão, propomos, por meio deste projeto, possibilitar que os acadêmicos participantes tenham oportunidade de construir ações pedagógicas diversas a partir de uma perspectiva outra, que atenda de fato a demandas indígenas, uma vez que as ações partirão deste olhar.

Metodologicamente, nos basearemos em Leyva e Speed (2008), que defendem o co-labor, segundo o qual “profissionais e comunidade [identificam] conjuntamente os problemas a resolver, deliberem ações a respeito e avaliem autonomamente o processo” (AMARAL, 2015).

O referencial teórico se sustentará nos trabalhos de intelectuais indígenas, como Inácio (2010) e Benites (2012), sendo que a primeira trata da pedagogia Kaingang e o segundo, da pedagogia Guarani.

O conjunto das ações a se desenvolver abrange: a) reuniões para estudar pedagogias outras (como a Kaingang e a Guarani); b) troca de experiências com indígenas (professores e outros profissionais); c) elaboração de material didático específico; d) sistematização e realização de atividades baseadas em políticas linguístico-educacionais específicas para comunidades indígenas.

Relato de experiência do Curso de Língua Kaingang na UEPG

Sabendo o quão necessário e importante é para os povos indígenas preservar suas línguas, dois acadêmicos Kaingang, Renato Pereira e Joel Anastacio, respectivamente alunos dos cursos de Odontologia e Agronomia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), em março de 2017 tomaram a iniciativa de colocar em prática uma ideia já cultivada ao longo de sua caminhada como acadêmicos universitários: propor a realização de um curso de língua Kaingang na instituição.

A proposta de realizar um curso de introdução à língua Kaingang dentro da universidade a princípio surgiu com o objetivo de proporcionar apenas a acadêmicos indígenas o resgate da língua, considerando que estes, quando se deslocam das suas comunidades em direção à cidade, acabam perdendo o contato direto com sua língua materna, o que muitas vezes faz com que acabem esquecendo o idioma.

O formato da proposta inicial foi sendo alterado a partir de reuniões e discussões realizadas entre os dois acadêmicos e a professora da instituição que acolheu a ideia do curso no âmbito do projeto de extensão “Formação inicial e continuada de professores de língua em comunidades multilíngues/ multiculturais”, que Renato e Joel passaram a integrar. Nas reuniões feitas, chegou-se à conclusão de que seria importante abrir a oferta do curso não apenas para a comunidade acadêmica indígena, mas também para pessoas não indígenas (inclusive comunidade externa) que tivessem interesse em conhecer uma nova língua que existe e resiste há muito tempo no país, a qual também é desconhecida por indígenas de outras etnias, alunos da UEPG.

A proposição do curso de língua Kaingang realizado na Universidade Estadual de Ponta Grossa entre maio e julho de 2017 seguiu os preceitos da pedagogia Kaingang, segundo a qual cabe ao professor Kaingang “[…] resgatar e valorizar as formas tradicionais Kaingang de repassar os conhecimentos para os jovens, porque essas formas não são meros métodos em fase de experimentação, mas sim metodologias aplicadas, avaliadas e aperfeiçoadas através dos tempos” (INÁCIO, 2010, p. 45, grifos nossos).

Leia o texto completo aqui 

Coletivo de Estudos e Ações Indígenas – CEAI

O CEAI é um coletivo situado no LET, que se dedica exclusivamente a desenvolver estudos e ações relacionadas aos povos indígenas. Começou sua trajetória em 2011, quando desenvolvemos nossos 3 primeiros projetos de pesquisa (financiados pela Fundação Araucária e CNPq), em conjunto com a comunidade Kaingang da Terra Indígena de Mangueirinha, PR, dos quais se originaram dois livros (uma cartilha de alfabetização em língua Kaingang e um livro de compilação de medicamentos tradicionais), um material didático de alfabetização em Kaingang e um outro livro (infanto-juvenil, trilíngue em português, Guarani e espanhol), que está em fase de edição. Em 2017, realizamos duas etapas do primeiro curso de língua Kaingang na Universidade Estadual de Ponta Grossa, por iniciativa de 2 estudantes indígenas da instituição. A realização do curso é que motivou o grupo a criar o coletivo para organizar as ações que serão desenvolvidas na sequência, como outros eventos e projetos de extensão e pesquisa, em âmbito de iniciação científica.